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Enfoque prático na alimentação do cão diabético

Enfoque prático na alimentação do cão diabético

05 de setembro de 2022

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Autor: Prof. Dr. Fabio Alves Teixeira

Docente da Faculdade Anclivepa. Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Nutrição e Nutrologia de Cães e Gatos da Anclivepa. Orientador específico pelo Programa de Pós-graduação em Clínica Veterinária da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP). Membro e Fundador da Sociedade Brasileira de Nutrição e Nutrologia de Cães e Gatos do Colégio Brasileiro de Nutrição Animal. Sócio fundador da Nutricare Vet. MV, MSc, Dr pela FMVZ/USP. Residência em nutrição e nutrição clínica pela FCAV/UNESP Jaboticabal.

O manejo nutricional dos pacientes caninos diabéticos envolve a seleção do alimento que estimulará a menor elevação glicêmica pós-prandial, com baixa oscilação da concentração de glicose ao longo do dia (TEIXEIRA; BRUNETTO, 2017). Também é importante observar que a alimentação pode ter efeito na minimização da hiperlipidemia, que é um achado frequente nos cães com diabetes mellitus (NELSON et al., 1998; GRAHAM et al., 2002; FLEEMAN; RAND; MARKWELL, 2009; TEIXEIRA et al., 2020).

De maneira geral, atualmente é considerado como o perfil nutricional indicado ao cão diabético: alimento com alta quantidade de fibra, alta proteína, moderada a baixa gordura e moderado em amido (TEIXEIRA; BRUNETTO, 2017). Já foi demonstrado que a alta ingestão de fibra causa diminuição da glicemia a ponto de reduzir as concentrações séricas de frutosamina, minimizar a glicosuria, gerar curvas glicêmicas menos oscilantes e, consequentemente, permitir diminuição na dose de insulina (NELSON et al., 1991, 1998, 2000; KIMMEL et al., 2000; GRAHAM et al., 2002).

Em relação à proteína, especificamente para cães diabéticos, não há estudo com este enfoque, mas sabe-se que a doença causa, em humanos, maior catabolismo proteico e, consequentemente, perda de massa muscular (PERRY et al., 2016). Além disso, a doença acomete mais cães de meia idade a idosos, que sabidamente são animais que podem apresentar sarcopenia, que é a perda de musculatura relacionada a idade (PAGANO et al., 2015). Já foi mostrado em estudos com cães obesos que o aumento na ingestão proteica auxilia na minimização da perda muscular dos carnívoros (KAWAUCHI et al., 2017). Além disso, dentre os macronutrientes energéticos, a proteína, em teoria, causa menor efeito direto na glicemia e lipidemia no cão diabético. Logo, pressupõe-se que um alimento hiperproteico seja indicado para esses animais.

A gordura, por sua vez, deve estar presente na alimentação dos cães, não só devido ao seu papel como palatabilizante, mas como fonte de nutrientes essenciais, como os ácidos graxos ômega-6 e ômega-3, que possuem diversas funções orgânicas (NRC, 2006). Atualmente, o principal motivo para diminuição na quantidade de gordura da dieta de cães é a ocorrência da hiperlipidemia, que pode ocorrer principalmente nos animais com endocrinopatias como: hiperadrenocorticismo, hipotireoidismo e diabetes mellitus (BRADA; TOBISKA, 1967; WILSON et al., 1986; BARRIE et al., 1993; XENOULIS; STEINER, 2015).

Em relação ao amido, esse é o fator mais estudado recentemente, uma vez que parece ser o maior influenciador da glicemia pós-prandial (CARCIOFI et al., 2008). Além da minimização da quantidade, é fundamental aos cães diabéticos que os ingredientes fontes de carboidrato digestível utilizados na sua alimentação sejam os considerados de assimilação lenta e que causam menor pico glicêmico pós-prandial e menor oscilação glicêmica ao longo do dia, como a ervilha e a cevada. Além disso, evidências recentes mostram que essas fontes de amido podem impactar também na hiperlipidemia dos cães diabéticos. A inclusão desses ingredientes na alimentação desses pacientes permitiu que os animais ingerissem quantidade um pouco maior de gordura, sem aumento nas concentrações plasmáticas de triglicerídeos e colesterol (TEIXEIRA et al., 2020).

Quando se trata de dieta, deve-se lembrar que não só o perfil nutricional do alimento é importante, mas também o manejo, ou seja, a quantidade calórica ingerida pelo paciente, bem como o número de refeições fornecidas (BALDWIN et al., 2010), todos fatores fundamentais a serem considerados na prescrição alimentar do cão diabético (TEIXEIRA; BRUNETTO, 2017).

Em relação ao número de refeições, estudos já demonstraram que quando os cães diabéticos recebem duas aplicações diárias de insulina, com intervalo de 12 horas, a alimentação deve ser fornecida duas vezes ao dia, preferencialmente antes da insulinização, para garantir que toda a quantidade de insulina seja administrada quando o paciente ingerir toda sua necessidade calórica (NELSON, 1989; TESHIMA, 2010; BEHREND et al., 2018). Vale ressaltar que este tratamento, baseado em duas administrações de insulina, é o mais recomendado aos cães com diabetes mellitus (BEHREND et al., 2018).

Apesar de não haver estudos que definam qual o melhor protocolo de definição de necessidade calórica para cães diabéticos, para realizar essa estimativa deve se levar em consideração alguns fatores como o peso do animal, o escore de condição corporal (ECC) e quão controlada está a doença. Caso o animal apresente adequado controle do diabetes mellitus, sem que ocorra perda de peso involuntária, a estimativa da necessidade energética é feita com base no ECC. Em animais com ECC ideal (4 e 5), é recomendado que seja utilizada a fórmula de necessidade energética de manutenção (NEM): NEM = 95 x PC0,75; em que PC = peso corporal (NRC, 2006). Aos com baixo ECC (menor que 4), pode-se utilizar a fórmula acima, considerando o peso ideal do paciente. Neste caso deve-se tomar o cuidado de estimar adequadamente o peso do paciente com base no ECC (LAFLAMME, 1997) e levar em consideração que a insulinização já é um estímulo para ganho de peso, ou seja, o paciente canino diabético pode ter ganho de peso excessivo ou muito rápido. Já nas situações de ausência de perda de peso involuntária por inadequado controle glicêmico, e animais com ECC acima do ideal, pode-se empregar protocolo para perda de peso, que envolve estimativa de necessidade energética para perda de peso (NEPP), em geral, iniciada com a fórmula NEPP = 70 x PM0,75; em que PM = peso meta do paciente, que pode ser estimado de maneira mais segura, inicialmente, como menos 10 a 20% do peso atual (BRUNETTO et al., 2011). Manter o peso no adequado ECC de condição corporal auxilia na redução da resistência insulínica, que pode ocorrer no cão obeso (GERMAN et al., 2009; BRUNETTO et al., 2011).

Com a definição da necessidade energética a ser fornecida, devemos dividir esse valor pela quantidade calórica (kcal/g) do alimento escolhido. O resultado, em gramas por dia, deve ser fornecido ao animal preferencialmente 50% junto a cada aplicação de insulina.

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Na prática da rotina clínica é importante o médico-veterinário se atentar que diferentes perfis nutricionais podem ser utilizados ao paciente canino diabético, a depender da situação de cada caso. Em seu estudo, Fleeman e colaboradores (2009) mostraram que quando um alimento com alta quantidade de fibra, moderada quantidade de gordura e alta quantidade de amido foi substituído por alimento com pouca quantidade de amido, pouca fibra e alta gordura, não houve modificação na glicemia dos cães, mas sim na hiperlipidemia. Por outro lado, alguns animais, quando receberam o alimento com pouca gordura, perderam peso, provavelmente pela menor palatabililidade e, consequentemente, a menor ingestão calórica. Isso é um exemplo de que, para o médico-veterinário, o conhecimento adequado em nutrição aliado a avaliação nutricional bem elaborada, pode permitir que as situações clínicas sejam manejadas com diferentes perfis nutricionais, com enfoque na qualidade de vida e longevidade dos pacientes.

Apesar de haver questionamentos sobre a necessidade de acréscimo de outros nutrientes na dieta dos indivíduos diabéticos, como suplementações com cromo, na medicina veterinária, especificamente para cães com diabetes mellitus, há poucos estudos que investigam essa necessidade. Em relação ao cromo, foi encontrado na literatura um estudo clínico com adequado delineamento científico que não mostrou efeito de melhora no controle glicêmico com o acréscimo desse elemento na dieta (SCHACHTER; NELSON; KIRK, 2001).

Com a prescrição de alimento que forneça todos os nutrientes essenciais ao cão, sob perfil nutricional que se adeque ao paciente canino diabético e com manejo dietético controlado em número de refeições e quantidade calórica, a grande parte dos pacientes caninos diabéticos estarão bem assistidos nos quesitos nutricionais, sem necessidade de constantes alterações.

Por fim, é importante relembrar que o tratamento do diabetes mellitus canino envolve manejo dietético, mas é fundamental que o paciente receba adequadamente a reposição hormonal de insulina (BEHREND et al., 2018), caso contrário, não haverá resposta satisfatória.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BALDWIN, K.; BARTGES, J.; BUFFINGTON, T.; FREEMAN, L. M.; GRABOW, M.; LEGRED, J.; OSTWALD, D. AAHA Nutritional Assessment Guidelines for Dogs and Cats. Journal of the American Animal Hospital Association, v. 46, n. 4, p. 285–296, 2010.

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