Orientador(a): Christine Souza Martins
Instituição: Universidade de Brasília
Trabalho Classificado na 10ª Edição (2024) do Prêmio de Pesquisa PremieRpet®.
Índice
Resumo
A microbiota ou microbioma é a relação simbiótica de colonização que bactérias, fungos, protozoários e outros seres têm com diferentes regiões do organismo animal. Os microrganismos presentes no sistema digestório de cães e gatos desempenham funções importantes na nutrição, imunidade e manutenção de processos fisiológicos, e por isso, a manutenção do microbioma equilibrado é fundamental para a saúde do hospedeiro. Existe uma relação intrínseca entre a saúde e o intestino e um microbioma saudável é considerado um importante órgão metabólico, visto que alterações que ocorrem na população bacteriana intestinal causam disbiose. A dieta é um dos fatores mais importantes no controle da microbiota e a principal linha de tratamento e prevenção das disbioses. Fatores dietéticos são capazes de gerar um microbioma saudável, como os probióticos, prebióticos e os simbióticos. A quantidade e qualidade das fibras na alimentação dos animais também está diretamente relacionada a algumas alterações no microbioma, assim como os teores de proteína.
Palavras-chave: Disbiose, microbioma, probióticos, prebióticos, psyllium.
Introdução
Os estudos que envolvem a microbiota vêm se tornando cada vez mais importantes nas descobertas científicas de diferentes alterações sistêmicas de cães e gatos, tal fato deve-se às limitações que a realização da cultura fecal impunha no desenvolvimento das pesquisas. No entanto, os avanços nas técnicas baseadas no sequenciamento do DNA, possibilitaram um conhecimento melhor do metabolismo e funcionamento das populações microbianas dos animais(HOODA, S. et al; 2012).
A microbiota ou microbioma é a relação simbiótica de colonização que bactérias, fungos, protozoários e outros seres têm com diferentes regiões do organismo animal, como a pele e trato gastrointestinal. Os microrganismos presentes no trato digestório de cães e gatos desempenham funções importantes na nutrição, imunidade e manutenção de processos fisiológicos dos animais e, por isso, a manutenção do microbioma equilibrado é vital para a saúde do hospedeiro( HOODA, S. et al; 2012). O desequilíbrio da microbiota já foi amplamente associado com o desenvolvimento de doenças, no entanto, ainda não é bem esclarecido se as alterações da microbiota levam a doença ou se a doença que leva às alterações da população bacteriana normal do trato gastrointestinal (TGI)(SCOTT, K. et al; 2015).
Vale salientar, também, que a microbiota intestinal mostrou papel primordial em sistemas que antes não se provava correlação. É o caso dos eixos entérico- nervoso, entérico-renal e entérico-dermatológico. Hoje, já é comprovado que o intestino está ligado diretamente às funções nervosas; a dieta é capaz de mudar o humor e como o indivíduo se sente, ao modular a microbiota. Os rins, por sua vez, estão relacionados diretamente com o trânsito e funcionamento intestinal.
Enquanto alterações dermatológicas ocorrem em alimentações desbalanceadas. Devido à fisiologia e anatomias diferentes entres as secções do sistema digestório, o microbioma intestinal tem diferentes populações de acordo com a topografia(SUCHODOLSKI,J.;2010), sendo o estômago um local de difícil
sobrevivência, tendo predominantemente a presença do Helicobacter spp.. O intestino grosso é o local com maior população bacteriana do trato gastrointestinal, composto basicamente por bactérias anaeróbias estritas, as responsáveis pelo processo de fermentação de nutrientes que não são aproveitados na dieta(BRESCHIANI, B. et al; 2018).
Além do processo de fermentação, os microrganismos contribuem com a proteção e imunidade do TGI. Ao disputar de maneira competitiva com patógenos, seja por nutrientes ou sítios de ligação, a microbiota favorece a resistência do hospedeiro contra esses organismos oportunistas (SUCHODOLSKI, J.;2010)( HOODA, S. et al; 2012).
Dito isso, fica evidente a relação intrínseca entre a saúde e o intestino(ALMEIDA, L. et al; 2008), e um microbioma saudável é considerado um importante órgão metabólico. Alterações que ocorrem na sua população são consideradas disbiose e ocorrem quando há mudança nas colônias naturais do hospedeiro, seja pelo aumento da quantidade de bactérias patogênicas ou pela diminuição de bactérias benéficas(SUCHODOLSKI,J.; 2021). Dentre as causas mais comuns de disbiose estão: o tratamento com antibióticos, anti-inflamatórios não esteroidais e corticoides; alterações dietéticas; senilidade; doenças que alteram o tempo de trânsito intestinal e/ou a secreção de líquidos digestivos(ALMEIDA, L. et al; 2008).
A etiologia da disbiose é diversa, e existem poucas doenças que não possuem a capacidade de alterar a microbiota. A produção de agentes tóxicos é acelerada em populações bacterianas com predominância patogênica, e estes mesmos agentes causam danos teciduais e sistêmicos aos serem absorvidos pelo sistema porta(ALMEIDA, L. et al; 2008). Outra consequência da disbiose é a produção de oxigênio, levando em consideração que a microbiota do cólon é majoritariamente anaeróbia estrita, esse processo está intimamente ligado à morte de bactérias simbióticas.
Este trabalho tem como objetivo analisar a importância do uso de pré e probióticos no manejo de pacientes saudáveis e doentes, tendo em vista a importância de uma microbiota saudável na homeostase fisiológica do sistema digestório. Além disso, o uso da fibra Psyllium foi avaliada como fator benéfico aos microrganismos do TGI devido sua característica de ambiguidade da fibra.
Saúde da microbiota
A dieta é a principal linha de tratamento das disbioses (HOODA, S. et al;2012). As bactérias convenientes ao hospedeiro são capazes de produzir enzimas eficientes na digestão de carboidratos complexos. O produto final desse processo são os ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), como o acetato, propionato e butirato, que também são importantes para o bom funcionamento e manutenção da microbiota. Esses ácidos graxos são a principal fonte energética para enterócitos e colonócitos e permite que mantenham os altos índices de replicação tecidual. Os AGCC também modulam o pH intestinal, fator este que está diretamente relacionado com a manutenção do ambiente impróprio do TGI para as bactérias patogênicas (SUCHODOLSKI,J.;2010)(ALMEIDA, L. et al; 2008).
A quantidade e qualidade das fibras na alimentação dos animais está diretamente relacionada a algumas alterações no microbioma, assim como os teores de proteína( HOODA, S. et al; 2012). Diferentes fibras causam diferentes alterações na microbiota e absorção do alimento. Fibras solúveis, usualmente são digeridas pelo hospedeiro, e geram grande quantidade de AGCC. A ação prócinética dos ácidos graxos pode ter como consequência a produção de fezes líquidas quando a suplementação ou oferecimento de fibras solúveis ocorre em excesso. As fibras completamente insolúveis, por outro lado, não são capazes de ser digeridas nem pela população bacteriana intestinal, nem pelo sistema digestório e são excretadas intactas nas fezes. Surge como opção interessante o Psyllium, que apesar de ser uma fibra solúvel, tem baixa capacidade de fermentação, e por isso, não tem efeito laxativo nos animais( FREICHE, V. et al; 2011). O conhecimento da ação de cada tipo de fibra pode auxiliar no tratamento de acordo com a afecção do TGI, o Psyllium, por exemplo, pode auxiliar animais com dificuldade em produzir fezes firmes( FREICHE, V. et al; 2011).
Outros fatores dietéticos são capazes de gerar um microbioma saudável, como os probióticos, prebióticos e os simbióticos(SUCHODOLSKI,J.; 2016). Os prebióticos são os substratos usados de forma seletiva pelas bactérias da microbiota para realizar o processo de fermentação, produzindo AGCC e assim auxiliam na nutrição de forma indireta dos colonócitos. Os principais prebióticos são os frutooligossacarídeos, galactooligossacarídeos e a inulina, porém muitos novos ainda estão em pesquisa. Os probióticos, por sua vez, são as bactérias benéficas oferecidas in vivo na alimentação do animal para auxiliar na composição da microbiota. Os simbióticos, por fim, são a combinação entre os pré e probióticos. (TANPRASERTSUK, J. et al; 2021)
No entanto, estudos demonstram que nem o oferecimento de simbióticos, nem a mudança de proteína na alimentação foram capazes de alterar drasticamente a microbiota de animais saudáveis. Mesmo assim, estes estudos relataram o aumento de bactérias benéficas durante o período de oferecimento dos simbióticos. Após a interrupção, os valores retornaram aos de normalidade de cada animal. Dessa forma, fica claro que a utilização de prebióticos, probióticos ou simbióticos não é de grande uso quando feita de maneira profilática e esporádica em animais sadios. Contudo, o uso prolongado em formulações de dietas secas pode ser uma solução para suprir nutricionalmente bactérias interessantes para a saúde intestinal (TANPRASERTSUK, J. et al; 2021).
Em um âmbito mais otimista, é comprovado que o fornecimento de dietas com pré e ou probióticos é capaz de restaurar de forma muito mais rápida a microbiota de animais com doenças entéricas (BRESCHIANI, B. et al; 2018).
No caso da doença inflamatória intestinal, pesquisas recentes mostraram que o uso de anti-inflamatórios sozinhos obteve pouca resposta quando comparado com o tratamento realizado com medicamentos, manejo da dieta e uso de probióticos. A individualidade animal não pode ser colocada de lado, sendo já comprovado que existem grandes diferenças na quantidade e tipos de bactérias presentes entre os animais, sejam sadios ou com desordens intestinais.
Considerações finais
Apesar das recentes e importantíssimas descobertas feitas na área da microbiologia intestinal, muito ainda há de ser investigado, principalmente sobre as particularidades causadas por cada espécie bacteriana, e não pelos gêneros, como analisamos atualmente. A medicina humana está à frente nas pesquisas do que a veterinária, no entanto, é um importante farol para guiar novas pesquisas, um exemplo disto, é a utilização de Oxalobacter formigenes. Seria essa uma bactéria capaz de auxiliar na degradação de urólitos de oxalato de cálcio? Assim, como essa, muitas perguntas ainda precisam ser respondidas, mas está clara a relação literalmente simbiótica que existe entre a microbiota intestinal e a saúde dos animais de companhia.
Referências bibliográficas
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