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A ingestão alimentar de gatos adultos pode ser influenciada pela temperatura ambiental?

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Autor(a): Mariana Pamplona Perini

Orientador(a): Márcio Antonio Brunetto

Instituição: FMVZ USP

Trabalho classificado na 9ª Edição (2023) do Prêmio de Pesquisa PremieRpet®.

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Índice

Resumo

A ingestão alimentar é uma preocupação frequente por parte de tutores de gatos, uma vez que muitos deles apresentam alterações de consumo de alimento. Estudos demonstraram os fatores internos e externos ligados a ingestão alimentar de gatos e um dos fatores externos, muitas vezes não considerado, é a temperatura do ambiente. Sabe-se que em outras espécies a temperatura influencia no consumo alimentar, o que interfere na absorção de nutrientes. Dessa forma, o presente estudo analisou se a temperatura ambiente influencia na ingestão alimentar de gatos adultos. Foram incluídos 12 gatos adultos saudáveis, machos e fêmeas, castrados, escore de condição corporal 5/9 e idade de 2,11 ± 0,5 anos. Os animais receberam dietas isonutrientes por 12 meses e foram distribuídos em 3 blocos casualizados com 4 animais cada. As sobras foram pesadas ao final do dia, em balança. As temperaturas foram registradas e coletadas na primeira refeição do dia, 7h00, por um termômetro de parede, o qual indicava as temperaturas mínimas e máximas. Todas os dados foram analisados com auxílio do procedimento MIXED do programa Statistical Analysis System, versão 9.4. As médias foram comparadas pelo Tesde de Tukey ao nível de 5,0% de significância. Os gatos tiveram o menor consumo na estação de maior temperatura (verão) seguido pela primavera, quando a temperatura começou a aumentar. Na estação mais fria (inverno) foram observadas as menores sobras e o maior consumo alimentar. A partir da temperatura de 23ºC, o consumo alimentar dos gatos reduziu e a temperatura que os animais apresentaram maior ingestão foi por volta de 20ºC. Além disso, a partir de 15,5ºC, temperatura mínima encontrada, os animais consumiram mais alimento. Conclui-se que a temperatura do ambiente influencia na ingestão alimentar de gatos adultos.

Introdução

A maioria dos tutores apresentam grande preocupação em relação a ingestão alimentar de seus gatos. Esses acreditam que a ingestão do alimento está associada apenas ao alimento em si, o que faz com que geralmente troquem de marca, erro comum verificado entre os donos de felinos. A fim de disseminar informações corretas sobre a ingestão alimentar em felinos, estudos avaliaram os possíveis fatores internos e externos ligados ao consumo de alimento por estes animais. Os fatores internos como a fisiologia, palatabilidade (Hours et al., 2016), preferências, castração, idade (Eyre et al., 2022), doenças (Freeman, 2012) e até mesmo lesões no hipotálamo, podem alterar o comportamento alimentar. O consumo alimentar de gatos castrados pode aumentar em até 12,0%, possivelmente devido ao maior sedentarismo (Kanchuk et al., 2003). Anand & Brobeck (1951) demonstraram que a destruição do hipotálamo bilateral está associada a ausência voluntária de ingestão alimentar. Já em relação a caquexia, condição corporal provocada pelas doenças, os mecanismos que a medeiam podem aumentar as necessidades energéticas, o que reduz a ingestão de energia e, por sua vez, prejudica a absorção de nutrientes ou por meio da inibição do centro da fome (Freeman, 2012).

Diante disso, os fatores externos que afetam a ingestão e escolha alimentar estão relacionados com o ambiente social e físico, o que inclui a presença de pessoas e sons, temperatura, odores, cores, tempo e distração. Mas, a temperatura, odor e textura dos alimentos podem, também, influenciar na escolha e ingestão dos alimentos (Stroebele & De Castro, 2004; Parker et al., 2022). Além disso, a composição dos alimentos também afeta no comportamento alimentar. Estudos demonstraram que o cálcio, fibra bruta e matéria mineral afetaram negativamente as preferências alimentares em gatos (Alegría-Morán et al., 2019).

A temperatura ambiental é determinante no consumo alimentar em frangos (Bonnet et al., 1997), vacas leiteiras (Becker et al., 2020), bovinos de corte (Lees et al., 2020), suínos (Quinjou et al. 2000), peixes (Buentello et al., 2000), humanos (Stroebele & De Castro, 2004) e cães (Burger, 1994). No entanto, a influência ambiental na saúde nutricional não é totalmente compreendida. Diante disso, o estudo objetivou avaliar se a temperatura do ambiente influencia na ingestão alimentar de gatos.

Material e Métodos

Foram incluídos 12 gatos adultos saudáveis, de ambos os sexos, castrados, com escore de condição corporal 5/9 (Laflamme 1997) e 2,11 ± 0,05 anos. Os animais receberam dietas isonutrientes por 12 meses, com três refeições diárias (7h00, 13h00, 15h30) em gaiolas individualizadas, com alimento disponível por 30 minutos. Os gatos possuíam acesso a água ad libitum e acesso a uma área externa, logo após as refeições, para socialização e atividade física. Após a socialização, os animais eram recolhidos para a sala de descanso/alimentação. Um termômetro digital de parede (Capela AGZ) foi instalado no ambiente de alimentação e descanso. O termômetro marcava as temperaturas mínimas e máximas do ambiente e a coleta dessas temperaturas eram feitas durante a primeira refeição diária e, na sequência, o equipamento era resetado. Os animais foram distribuídos em 3 blocos casualizados com 4 animais cada, de acordo com o consumo diário total. Ao final do dia, as sobras eram pesadas em balança de semi-precisão e anotadas para posterior análise.

Para avaliação dos efeitos das estações sobre as  percentagens  de sobras, utilizou-se modelo misto considerando o efeito fixo de estações e os efeitos aleatórios de animal e resíduo. O efeito de animal foi utilizado para incorporar a estrutura de medidas repetidas nas mesmas unidades experimentais. As análises de regressão foram realizadas considerando os mesmos efeitos aleatórios e a temperatura média como variável independente. Todas as avaliações foram realizadas com auxílio do procedimento MIXED do programa Statistical Analysis System, version 9.4 (SAS Institute Inc., Cary, NC, USA). As médias foram comparadas pelo Teste de Tukey ao nível de 5,0% de significância.

Resultados

Os gatos tiveram o menor consumo na estação de maior temperatura (Tabela 1), seguido pela primavera, na qual a temperatura começa a aumentar. Nas estações mais frias, foram observadas as menores sobras (Figura 1).

A;B Médias em uma mesma coluna e seguidas por uma mesma letra maiúscula, não diferem entre si ao nível de 5,0% de significância pelo Teste de Tukey.

A partir da temperatura de 23ºC, o consumo alimentar dos gatos reduziu e a temperatura que os animais mais consumiram foi a 20ºC. Além disso, a partir de 15,5ºC, temperatura mínima encontrada, os animais consumiram mais alimento, devido à baixa temperatura ambiental.

Discussão

Os gatos possuem uma zona de neutralidade térmica entre 35 a 38ºC, mas isso pode variar de acordo com a ambientação do animal, ou seja, do clima que o animal está habituado a viver. Essas zonas são temperaturas ambientais a que o gasto energético é mínimo (Burger, 1994). Em nosso estudo, a temperatura máxima avaliada foi de 29ºC, na qual foi observado consumo alimentar menor, dados que corroboram os de Adams et al. (1970) e Tauson (1999). No verão, os consumos foram menores em comparação com as outras estações, seguido pela primavera. Serisier et al. (2014) também encontraram consumos alimentares menores nos meses do verão (25,1ºC) e maiores no final do outono e do inverno (6,7ºC), mesmo coletando temperaturas externas ao ambiente de alimentação dos gatos.

Em ambientes com baixas temperaturas, os gatos consomem mais alimento devido à baixa produção de calor, o que facilita a termogênese (Hoening & Ferguson, 2002). No presente estudo foi observado aumento no consumo alimentar em ambiente mais frio (15,5 a 20ºC). As fêmeas, durante o inverno, apresentaram maior ingestão alimentar em comparação aos machos e, no verão os machos apresentaram preferência alimentar por dietas mais palatáveis (Alefría-Morán et al., 2019). Outro estudo não observou diferença no consumo alimentar de gatos seniores durante as estações do ano (Bergmingham et al., 2010). Em algumas raças de cães parece ser o contrário, se a temperatura ambiente aumenta ou diminui, a necessidade energética tende a aumentar em ambos os casos. Em temperaturas no intervalo de -22 a +17ºC, Beagles possuem maiores necessidades energéticas nos dois extremos de temperatura (Burger, 1994).

Os animais são adaptados ao ambiente e às temperaturas ambientais conforme a sua exposição ao longo da vida. O presente estudo foi realizado em clima tropical, no qual as temperaturas podem variar de 2ºC a 40ºC. De acordo com Hensel & Banet (1982), em ambientes frios os gatos apresentaram metabolismo 45,0% mais elevado, o que foi compensado pelo aumento do consumo alimentar. Além disso, os autores demonstraram que os gatos mais adaptados ao frio apresentaram maior crescimento dos pelos e aumento do metabolismo em repouso em taxa de 20,0%.

Conclusão

O consumo médio de alimentos no verão é 7,5% inferior ao consumo alimentar durante o inverno. Diante disso, pode-se considerar a temperatura do ambiente um dos fatores externos que influencia na ingestão alimentar em gatos, o que auxiliará nutricionistas a realizar cálculos da necessidade energética de manutenção de forma diferenciada no verão.

Referências bibliográficas

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