Autores: M.V. MSc. Maria Eduarda Gonçalves Tozato; M.V. Drª Camila Goloni e Prof. Dr. Aulus Cavalieri Carciofi (Serviço de Nutrição Clínica do Hospital Veterinário da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da UNESP, campus Jaboticabal)
Gatos domésticos apresentam um metabolismo hídrico particular comparado aos cães e animais onívoros (NRC, 2006), devido à sua descendência do gato selvagem africano de origem desértica, Felis silvestres lybica (O’BRIEN e YUHKI, 1999). Felinos domesticados manifestam a capacidade de permanecer longos períodos em escassez hídrica, com menor resposta à sede e desidratação e maior propensão à concentração urinária (NRC, 2006). O resultado é a não compensação do consumo de água quando alimentados com dietas de baixa umidade (ANDERSON et al., 1982; ZORAN, 2002). Além das características fisiológicas, outros fatores associados ao ambiente, socialização, comportamento, manejo sanitário e fontes de água de bebida podem interferir no balanço hídrico e ocasionar desidratação e urina supersaturada. Como consequência, esses animais podem diminuir a procura por água, favorecendo os distúrbios do trato urinário inferior (CARCIOFI; BAZZOLI; ZANNI, 2005; CASE, 2011).
Com a domesticação, gatos que recebiam boa parte da água por suas presas, passaram a receber menor quantidade de água ao se alimentarem com dietas secas. O consumo de alimento extrusado seco, muito popular entre os tutores atualmente, parece resultar na eliminação de menor quantidade de urina (LEKCHAROENSUK et al., 2001; CARCIOFI et al., 2005). Quando alimentados com alimentos secos, em comparação a cães e animais onívoros, os gatos têm menor resposta de compensação de consumo de água de bebida (ANDERSON et al., 1982; ZORAN, 2002; NRC, 2006) e podem apresentar aumento nas concentrações de substâncias formadoras de urólitos.
O estímulo à ingestão hídrica em gatos pode ser feito de diversas maneiras, sendo a mais simples aumentar o teor de água do alimento, promovendo maior ingestão hídrica e maior excreção urinária (ANDERSON, 1982; CARCIOFI et al., 2005). De acordo com o NRC (2006), a razão entre balanço de água e caloria em alimentos secos para gatos é de 0,7, enquanto em alimentos úmidos é de 1, demonstrando haver maior consumo de água em alimentos com maior teor de umidade.
Diretrizes para aumentar a ingestão hídrica de felinos
1 | Quando possível, empregar versão úmida (sachê) da dieta desejada. |
Alimentos úmidos contêm, aproximadamente, 75-85% de umidade. Recomenda-se fornecer opções de alimentos úmidos e secos para gatos, pois uma mudança abrupta da dieta pode não ser bem tolerada. | |
2 | Caso seja viável, adicionar água ao alimento seco. |
Iniciar com 1 xícara de água em 1 xícara de alimento seco, que resultará em 50% de umidade, não sendo ainda suficiente para elevar a produção de urina e reduzir a densidade urinária dos gatos. Aumentar gradualmente o volume de água por 3 a 4 semanas. Recomenda-se misturar de 3 a 4 xícaras de água em 1 xícara de alimento seco para obter, ao final, aproximadamente 85% de umidade. Avaliar a densidade urinária específica e o sedimento urinário periodicamente. Coleta espontânea no ambiente habitual é o ideal. |
Quanto maior o teor de água do alimento, maior a ingestão de água via alimento , o que resulta também em redução na ingestão voluntária de água no bebedouro. A fim de avaliar a influência do alimento sobre a ingestão hídrica e excreção urinária de água, CARCIOFI et al. (2005) avaliaram quatro dietas com diferentes quantidades de água e diferentes digestibilidades: alimento comercial seco, econômico; o mesmo alimento comercial seco com adição de 50% de água; alimento comercial seco super premium, com alto teor de proteína e gordura; e alimento comercial úmido.
Somente quando alimentados com alimento úmido (com mais 80% de umidade), os gatos apresentaram maior ingestão total de água. Com a dieta úmida, mesmo reduzindo a ingestão de água via bebedouro, a produção de urina foi maior e sua densidade menor. Nas rações secas, para cada grama de matéria seca de alimento ingerido, os gatos consumiram de 2,4 a 2,6 mL de água, enquanto no alimento úmido ingeriram 4,7 mL de água por grama de matéria seca consumida.
Em outro estudo, BUCKEY (2011), utilizando dieta padronizada com inclusões crescentes de água, demonstrou que gatos alimentados com dieta com 73,3% de umidade tiveram maior ingestão diária total de líquidos e produziram urina com densidade significativamente menor (1,036 vs 1,054) em relação à dieta com 6,3% de umidade.
TOZATO et al (2022) avaliaram alimentos secos e úmidos (8% de umidade versus 80%) com diferentes proporções de amido (15% versus 30%) e proteína (36% versus 53%). O consumo de alimentos com mais de 80% de umidade resultou em maior ingestão de água total, aumento de 64% no volume urinário, redução da densidade da urina e supersaturação para oxalato de cálcio e estruvita.
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Outras estratégias de maior excreção urinária estão na concentração de nutrientes na formulação das dietas, como o aumento do consumo de proteína (HAWTHORNE; MARKWELL, 2004; GARCIA et al., 2020; GOLONI et al., 2021;TOZATO et al., 2022) e do teor de sódio em dietas secas (CHANDLER, 2008) e bebidas comerciais (CARCIOFI; VASCONCELLOS, 2009).
Considerações finais
Gatos fazem balanço hídrico com reduzida necessidade de ingerir água. Medidas para para aumentar o volume hídrico total ingerido pelo animal incluem:
- Uso de alimentos úmidos (umidade maior que 70%);
- Fornecimento de água à vontade e em diversos locais da residência;
- Palatabilização da água de bebida;
Todas essas medidas devem ser acompanhadas quanto à sua efetividade, instruindo o tutor a mensurar o consumo de água dos animais e avaliação periódica da densidade e sedimentos na urina dos pacientes felinos.
Para uma leitura completa do conteúdo acesse o PremieRvet “Alimentação úmida, seca e balanço hídrico de gatos”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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GOLONI, C. Dietas com diferentes relações amido:proteína na composição corporal, metabolismo energético, saciedade, turnover hídrico e atividade física de gatos em laboratório ou em domicílio. Tese (Doutorado em Clínica Médica) – Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” 105p, 2021.
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LEKCHAROENSUK C, OSBORNE JP, LULICH R, PUSOONTHORNTHUM CA, KIRK LK. Association between dietary 402 factors and calcium oxalate and magnesium ammonium phosphate urolithiasis in cats. Journal of the American Veterinary Medical Association. 219:1228-1237, 2001.
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ZORAN D.L (2002) The carnivore connection to nutrition in cats. Journal of the American Veterinary Medical Association, 221: 1559–1567.