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Orientador(a): Thiago Henrique Annibale Vendramini
Instituição: Universidade de São Paulo\/USP – FMVZ – Cepen Pet
Trabalho Classificado na 10ª Edição (2024) do Prêmio de Pesquisa PremieRpet®.
Índice
Resumo
Os pacientes oncológicos caninos frequentemente enfrentam desafios consideráveis durante o tratamento e a recuperação pós-cirúrgica. Os óleos essenciais têm sido estudados por suas propriedades antioxidantes e benefícios terapêuticos potenciais. Este estudo de caso investigou o impacto da inclusão de uma mistura de óleos essenciais na dieta de um cão com neoplasia mamária maligna submetido a cirurgia, envolvendo ovariohisterectomia, mastectomia bilateral e linfadenectomia. A paciente, um cão, sem raça definida, de 13 anos de idade, recebeu uma dieta experimental contendo óleos essenciais de Ocimum gratissimum e Thymus vulgaris microencapsulados, com dose de 150 ppm na ração, por um período de 60 dias. Esses óleos essenciais são conhecidos por suas propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes e antimicrobianas, devido aos seus compostos ativos como eugenol e timol. Estudos anteriores relataram que a remoção total da cadeia mamária pode expor os pacientes a consequências como dor intensa e aumento do risco de complicações pós- cirúrgicas, tais como deiscência da sutura, inflamação e edema. Tais complicações podem desencadear efeitos adversos no corpo, como aumento dos níveis de cortisol, estresse metabólico e imunossupressão, o que compromete a recuperação. No entanto, os resultados deste estudo sugeriram que a inclusão de óleos essenciais na dieta pós-cirúrgica pode minimizar esses efeitos e contribuir positivamente para a recuperação do paciente. Portanto, a mistura pode ter contribuído positivamente para o processo de cicatrização e minimizado o risco de infecções.
Introdução e revisão de literatura
A neoplasia mamária em cadelas é uma doença relevante na clínica de animais de companhia e tem sido amplamente estudada devido ao seu papel como modelo para a pesquisa do câncer de mama em humanos (MARTINS & FERREIRA, 2003). Os tumores mamários representam cerca de 50 a 70% de todas as neoplasias em cadelas (DALECK & NARDI, 2016), e tendem a afetar principalmente fêmeas caninas de meia-idade ou em estágio avançado da vida, uma vez que há aumento em sua incidência após os seis anos de idade (SORENMO et al., 2009).
A excisão cirúrgica das neoplasias mamárias é considerada a abordagem terapêutica preferencial, com o objetivo de remoção do tumor e a promoção do bem-estar da paciente (QUEIROGA & LOPES, 2002; FOSSUM, 2014). No entanto, tal intervenção cirúrgica pode apresentar desafios, como deiscência dos pontos, necrose tecidual e infecção, o que realça a importância de métodos que auxiliem na cicatrização e recuperação pós-operatória (FOSSUM, 2014).
Além disso, o envelhecimento está associado a mudanças prejudiciais, que inclui diminuição na capacidade de resposta ao estresse, desequilíbrio homeostático e aumento do risco de doenças crônicas, muitas das quais estão relacionadas à senescência (BANSAL & KAUSHAL, 2014). Durante o envelhecimento, observa-se um declínio progressivo na capacidade de controlar os danos causados pelo estresse oxidativo, o que resulta em alterações nas biomoléculas celulares e maior produção de radicais livres (KARIHTALA & SOINI, 2007). Soremno et al. (2013) sugerem uma possível associação entre o envelhecimento e uma maior incidência de câncer em cães, destacando que as lesões no DNA desempenham um papel central na perda de funções biológicas e na promoção da imunossenescência (BLOUNT et al., 2004).
Os óleos essenciais (OE) estão cada vez mais difundidos na alimentação humana assim como animal, pois a utilização de nutracêuticos ou ingredientes funcionais vem ganhando espaço no mercado. Além disso Oriundos de materiais vegetais, consistem em uma ampla gama de substâncias de natureza química diversificada. Conhecidos como fitogênicos nos animais, esses são utilizados para obter melhorias na produção e estabilidade nas rações, assim como componentes funcionais com efeitos na saúde animal. Representam uma família de substâncias complexas e lipossolúveis, com ampla aplicação na terapia e dieta animal (FIGUEIREDO, 2017).
Os ingredientes funcionais em alimentos para animais de companhia, podem desempenhar um papel significativo na promoção da saúde e na aceleração do processo de cicatrização em pacientes oncológicos pós-cirúrgicos (QUEIROGA & LOPES, 2002). Este estudo de caso investigou o impacto da inclusão de uma mistura de óleos essenciais na dieta de um cão com neoplasia mamária maligna submetido a cirurgia, com foco na importância do processo de cicatrização nessa paciente.
Relato de caso
Um cão, fêmea, sem raça definida, sênior, com idade de 13 anos, com peso de 13,2 kg, com escore de condição corporal 7/9 (LAFLAMME, 1997) e escore de massa muscular 2/3 (MICHEL et al., 2011) foi recebida para realização de triagem em estudo clínico. Realizada assim a anamnese do animal, durante a qual foram constatados nódulos e tumores mamários bilaterais. Desta forma, foi recomendada transferência deste animal para a rotina clínica hospitalar da unidade.
Prosseguiu-se para a realização da primeira consulta com a paciente na unidade hospitalar recomendada. Durante o exame físico foi confirmada presença de dois tumores bilaterais na região mamária. Na região torácica esquerda, próximo ao final do processo xifoide, apresentava dimensões 8,3×7 cm com consistência flácida e pendular, macio, não aderido e não ulcerado. Entre M1 e M2 ao lado direito com dimensão 9,7×9,8 cm com consistência firme e pendular, parcialmente aderido e ulcerado. Na região abdominal observou presença de dois tumores na região mamária e outro na região umbilical. Tumor na região entre M4 e M5, do lado esquerdo com dimensão de 6,5×8 cm, com consistência firme e pendular, não aderido e não ulcerado, na mesma região ao lado direito tumor medindo 4,5×4,5 cm com consistência firme e pendular, não aderido e não ulcerado. Na região mesogástrica havia um nódulo medindo 2,5×1,5 cm com consistência firme (Figura 1). Com presença de pápulas e nódulos em toda cadeia mamária do lado direito e esquerdo. Foram receitados Meloxicam (0,5 mg, BID, durante cinco dias), Ivermectina (dose única de 12 mg) e Albumina (28 mg, BID, durante sete dias).
Dentre os exames complementares, foram solicitados radiografia de tórax e ultrassonografia abdominal (US), assim como hemograma, perfil renal e perfil hepático. O hemograma resultou em proteína plasmática total de 9,6 g/dL, conclusão para hiperproteinemia (6,0 – 8,0 g/dL), trombocitopenia de 122.000 plqts/mm³ (200.000 – 500.000 plqts/mm³) e leucopenia de 5400 /uL (6.000 – 17.000 /uL). Da avaliação de perfil renal, creatinina e ureia não apresentaram alterações. A fosfatase alcalina, enzima associada à função hepática demonstrou valor ligeiramente aumentado de 98 U/I (10 – 96 U/I). As alterações hematológicas, bioquímicas e trombocitopenia estão em conformidade com o esperado para pacientes oncológicos.
Ademais, foram realizados eletrocardiograma, a fim de que fossem descartadas outras alterações que pudessem impedir ou contraindicar a realização do procedimento cirúrgico, sem verificação de alterações impeditivas para o procedimento cirúrgico. Posteriormente a paciente foi submetida ao tratamento pela técnica de mastectomia bilateral total das cadeias mamárias, assim como ovariohisterectomia e linfadenectomia (Figura 2).
No pós-operatório foi receitado medicamentos com administração oral de Cefalexina (250mg, 5ml, BID, durante sete dias), Omeprazol (20mg, BID, durante sete dias). Também foi prescrita limpeza da ferida cirúrgica com solução fisiológica e rifocina spray durante 14 dias. Sete dias após o procedimento, foi realizado consulta para retorno e prescrito Furosemida (10mg, BID, durante três dias). O acompanhamento do processo de cicatrização da paciente ocorreu nos seguintes intervalos após a cirurgia: 7, 15, 25, 35, 45 e 55 dias (figura 3).
Foi constatado trinta e cinco dias após o procedimento que a paciente havia apresentado melhoria da ferida cirúrgica, a incisão apresentou-se parcialmente cicatrizada, porém com áreas de deiscência de pontos e formação de placa bacteriana em região torácica e região inguinal, respectivamente, foi orientado a tutora a permanência da limpeza com solução fisiológica e aplicação de pomada Vetaglós para auxiliar na cicatrização.
Quarenta e cinco dias após a cirurgia, durante uma inspeção, foi observado tecido de granulação evidente e conclusão da epitelização. Os curativos foram removidos, entretanto, a manutenção da limpeza foi mantida, com utilização de solução fisiológica e a área permaneceu coberta com roupa cirúrgica, por um período mínimo de mais 5 dias (figura 4).
Referente ao manejo alimentar, o animal consumia uma dieta comercial de manutenção, a qual foi reajustada para uma dieta controle experimental (com conservantes sintéticos BHA e BHT) na inclusão de 150 ppm, foi fornecido uma quantidade diária de 173 gramas, duas vezes ao dia, este animal permaneceu durante 30 dias consumindo tal dieta, após remanejada para dieta teste (Alimentação com uma dieta formulada para cães idosos, com a inclusão 150 ppm de Ocimum gratissimum – alfavacão e Thymus vulgaris – tomilho), por um período de 60 dias, iniciando um dia após a cirurgia.
Discussão
A ressecção cirúrgica é considerada a abordagem preferencial para o tratamento de tumores na glândula mamária em cães, reconhecida como o método mais eficaz para alcançar o controle local do tumor (MACEWEN et al., 1984; SOREMNO et al., 2013). Essas neoplasias são conhecidas por serem dependentes de hormônios e, em muitos casos, podem ser evitadas se a ovariohisterectomia for realizada antes do primeiro cio (CIRILLO, 2008). Portanto, a mastectomia realizada neste estudo de caso foi de suma importância para o tratamento paliativo da paciente. Constatou-se boa recuperação em relação ao tratamento, com recomendação de remoção total da cadeia mamária bilateral. Kennedy et al. (2011) afirma que tais métodos cirúrgicos podem levar a complicações como formação de seroma, infecção incisional e deiscência da incisão.
Os OEs são compostos bioativos capazes de otimizar a saúde, podendo auxiliar no processo de cicatrização dos pacientes. Em virtude de seus vastos benefícios, a pesquisa com o uso de óleos essenciais em seres humanos e animais tem se intensificado, principalmente no que se refere às suas propriedades antibacterianas, antifúngicas, antivirais, antitumorais e anti- inflamatórias (DHIFI et al., 2016; ZAKERIAN et al., 2017).
A alfavaca, também conhecida como manjericão, é uma planta que possui dois compostos que podem ser extraídos, como o timol ou eugenol. Estudos demonstram que o eugenol, encontrado em algumas variedades de alfavaca, tem a capacidade de reduzir a inflamação e ajudar na cicatrização. Ele pode bloquear substâncias inflamatórias e reduzir a expressão de genes associados à inflamação. O eugenol possui propriedades imunomoduladoras em animais, como a capacidade de reduzir a inflamação induzida por lipopolissacarídeos e bloquear a liberação de interleucina-1 beta, fator de necrose tumoral alfa e prostaglandina E2 de macrófagos (LI et al., 2006; TREVISAN et al., 2006; LEE et al., 2007; LEE et al., 2008; MAGALHÃES et al., 2010).
O tomilho, como é conhecido popularmente, ou Thymus vulgaris é uma planta utilizada tradicionalmente no tratamento de diversas doenças inflamatórias, assim como por seus efeitos antibacterianos, antifúngicos e de cicatrização. Estudos revelam que a mistura de óleos sendo um deles o tomilho, apresenta propriedades sinérgicas e eficazes contra infecções cutâneas em cães. (ZARZUELO & CRESPO, 2002; FACHINI-QUEIROZ et al., 2012).
Com base neste estudo clínico que investigou o impacto do consumo de uma dieta contendo um blend de óleos essenciais no processo de cicatrização, podemos considerar com embasamentos citados anteriormente que essa intervenção oferece uma potencial alternativa para auxiliar no período pós- operatório de pacientes submetidos a cirurgias complexas, como a mastectomia bilateral. O acompanhamento de cicatrização sugere que essa abordagem pode contribuir para a redução da inflamação durante o pós-cirúrgico. Os estudos citados indicam que o eugenol, presente na alfavaca, e o timol, encontrado no tomilho, possuem propriedades anti-inflamatórias. A inclusão desses compostos na dieta pode ter contribuído para a redução da inflamação no período pós- operatório da paciente. Minimizando assim a resposta inflamatória excessiva associada à cirurgia, promovendo uma recuperação com menor desconforto e convalescença mais tolerável. Esse blend de óleos essências, podem ter auxiliado na prevenção de infecções e no agravamento do pós-operatório.
Conclusão
A utilização da dieta contendo um blend de óleos essenciais revelou-se promissora no auxílio ao processo de cicatrização pós-operatória em paciente submetida a uma cirurgia complexa, como a mastectomia bilateral, de acordo com os achados de estudos prévios. O eugenol da alfavaca e o tomilho, têm sido consistentemente documentados em pesquisas por suas propriedades anti- inflamatórias e cicatrizantes, sugerindo seu potencial para reduzir complicações e facilitar uma recuperação mais eficaz após a cirurgia.
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