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Nutrição do paciente canino e felino durante a internação na serra gaúcha

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Autor(a): Marina Polesso

Orientador(a): Antonella Souza Mattei

Instituição: Universidade de Caxias do Sul

Trabalho classificado na 8ª Edição (2022) do Prêmio de Pesquisa PremieRpet®.

[Arquivo PDF][Acervo completo]

Índice

Resumo

As escolhas do médico veterinário em relação à nutrição do paciente internado interferem na qualidade de vida do animal durante o período de hospitalização, no tempo de recuperação, na prevenção de síndromes metabólicas secundárias e na manutenção do peso e do escore corporal ideal. Levando em conta tais informações, desenvolveu-se uma pesquisa para determinar o perfil do médico veterinário atuante em hospitais e clínicas veterinárias de cães e gatos da região da serra gaúcha (Rio Grande do Sul). Um questionário virtual foi construído contemplando as seguintes variáveis: necessidade energética de manutenção (NEM), quantidade, tipo e frequência do alimento, utilização de orexígenos, conduta inicial para reversão da anorexia, estímulo de consumo hídrico e principais enfermidades que causaram a internação do paciente internado. Após a obtenção das respostas, estas foram tabuladas e determinada sua frequência. Dos 100 convites enviados, 53 pessoas responderam ao questionário, sendo a maioria proveniente de Caxias do Sul (73,4%). A NEM era sempre calculada por 34% dos entrevistados. Em relação ao horário e a frequência de fornecimento alimentar, apenas 3,8% dos entrevistados realizavam. Os orexígenos eram utilizados como primeira opção apenas por 22,6% dos entrevistados. A adição de água ao alimento foi escolhida por 71,7% dos participantes como opção para aumentar o consumo hídrico. O alimento úmido foi a primeira escolha para o paciente internado. As enfermidades mais frequentemente relacionadas à internação foram as de caráter gastrointestinal. Assim, pode-se observar que há necessidade de aprimoramento dos médicos veterinários da serra gaúcha na área de nutrição.

Palavras-chaves: Alimentação. Distúrbio metabólico. Prescrição hospitalar. Canino. Felino. Hospitalização.

Introdução

A nutrição desempenha um papel fundamental durante todos os momentos da vida do cão e do gato. Desse modo, esta é necessária para o desenvolvimento, crescimento e manutenção durante as fases adulta e geriátrica. Por ser tão necessária, a sua deficiência acarretará em estresse metabólico, sendo contornado de maneiras diferentes, de acordo com o estado de saúde do paciente (WERNIMONT et al., 2020; WSAVA, 2011).

O cão e o gato doente, devido à necessidade de reparar os danos causados pela enfermidade, aumenta a mobilização calórica que provém de proteínas e outros substratos, aumentando proporcionalmente a necessidade dos nutrientes gastos, para garantir a homeostase e que o animal tenha a chance de se recuperar (DUDRICK, 2009; CORBEE, VAN KERKHOVEN, 2014).

As escolhas tomadas pelo médico veterinário em relação à nutrição do seu paciente internado interferem na qualidade de vida do animal durante a hospitalização, no tempo de recuperação, na metabolização dos fármacos instituídos, na prevenção de síndromes metabólicas secundárias, na manutenção do peso e escore corporal ideal. Estima-se que ainda, grande parte dos pacientes internados esteja recebendo um aporte nutricional deficiente, prejudicando seu prognóstico e respectiva alta hospitalar (FABRETTI et al., 2013). Dessa maneira, os profissionais devem preocupar-se em proporcionar ao paciente uma alimentação correta e que atenda suas necessidades, pois animais doentes frequentemente se encontram em profundo desarranjo metabólico, dependendo do suporte nutricional (CODNER, 2012).

Levando essa informação em conta e buscando entender o cenário da região da Serra gaúcha (Rio Grande do Sul) foi realizada uma pesquisa para determinar o perfil do médico veterinário atuante em hospitais e clínicas veterinárias de cães e gatos, à atualidade observada na rotina clínica.

Material e métodos

Foram convidados a participar da pesquisa médicos veterinários atuantes em hospitais e clínicas veterinárias com internação de cães e gatos pertencentes à Serra Gaúcha, durante o período de fevereiro de 2021. Para a pesquisa foi utilizado o software “Google Formulários®”, e o link enviado por mensagem eletrônica aos médicos veterinários da região da Serra Gaúcha. A participação foi anônima mediante a autorização do entrevistado após uma breve explicação sobre a pesquisa.

A amostra estudada foi obtida por conveniência e as variáveis determinadas foram relacionadas às escolhas individuais dos participantes quanto à nutrição dos seus pacientes durante a internação. Os participantes foram questionados sobre a necessidade energética de manutenção (NEM), quantidade, tipo e frequência do alimento, utilização de orexígenos, conduta inicial para reversão da anorexia, estímulo de consumo hídrico, controle do peso do internado e principais enfermidades que causaram a internação. Após a obtenção das respostas, estas foram tabuladas e determinada sua frequência.

Resultados

Dos 100 convites enviados, 53 pessoas responderam ao questionário. A maioria dos participantes era proveniente de Caxias do Sul (73,4%). O restante pertencia a Bento Gonçalves, São Marcos, Flores da Cunha, Vacaria, Nova Petrópolis, Veranópolis e Antônio Prado, correspondendo a 3,8% dos entrevistados cada.

Assim, a necessidade energética de manutenção (NEM) era sempre calculada por 34% dos entrevistados, enquanto que, 47,2% dos participantes determinavam somente para os pacientes em estado crítico e 18,8% não estipulavam a NEM.

Em relação ao horário e a frequência de fornecimento alimentar, apenas 3,8% dos entrevistados determinavam o horário e quantidade oferecida, sendo que, 58,5% especificava apenas os horários, 24,5% determinava apenas a quantidade e 13,2% não determinam.

Os estimulantes de apetite medicamentosos eram utilizados como primeira opção para 22,6% dos entrevistados, enquanto que 75,5% utilizavam apenas quando outras técnicas de estímulo à alimentação falharam, como por exemplo, mudança do tipo do alimento oferecido ou sua temperatura. A minoria, composta por 1,9% dos entrevistados não utilizavam este tipo de medicamento.

A maioria dos entrevistados (84,6%) costumava aquecer o alimento antes de oferecer ao paciente, sendo que 13,5% oferecia o alimento na temperatura na qual foi conservado e apenas 1,9% tentava oferecer em diversas temperaturas.

A adição de água ao alimento foi escolhida por 71,7% dos participantes em relação ao aumento do consumo hídrico. Além disso, 18,9% estimulavam de outra maneira e 9,4% dos participantes não se preocupavam em aumentar a ingestão de água.

O alimento úmido (sachê) foi escolhido por 63,5% dos entrevistados como primeira escolha para o paciente internado. As outras opções citadas estão descritas na figura 1

Tipo de alimento utilizado como primeira escolha (porcentagem) para o paciente canino e felino durante a internação em hospitais e clínicas veterinárias da Serra gaúcha
Figura 1 - Tipo de alimento utilizado como primeira escolha (porcentagem) para o paciente canino e felino durante a internação em hospitais e clínicas veterinárias da Serra gaúcha

A tabela 1 demonstra os métodos utilizados para o fornecimento do alimento em pacientes caninos e felinos em anorexia e internados. Pode-se observar que a maioria realizava a administração do alimento forçado através da seringa em cães (66,1%), enquanto que, nos pacientes felinos, as sondas nasogástrica e esofágica representaram 75,5% da escolha.

Método de escolha para reversão da anorexia do paciente canino e felino durante a internação realizado pelos médicos veterinários da Serra gaúcha
Tabela 1 - Método de escolha para reversão da anorexia do paciente canino e felino durante a internação realizado pelos médicos veterinários da Serra gaúcha

O controle do peso corporal do paciente durante o período de internação era realizado por 55,7% dos participantes, sendo que 25% não costumava pesar o paciente e 19,3% realizava a pesagem apenas na entrada e alta do paciente.

Quando questionados sobre as enfermidades mais frequentemente relacionadas a internação desses pacientes, as de caráter gastrointestinal corresponderam a 88,5% das respostas, seguidas das doenças renais/urinárias (84,6%), virais (46,2%), respiratória (34,6%), reprodutiva (30,8%), cardiovascular (13,5%), ortopédica (3,8%) e oncológica (1,9%), respectivamente.

Discussão

Com base nas respostas obtidas, foi possível perceber que ainda há falta de informação sobre a conduta nutricional durante a internação de cães e gatos na serra gaúcha. Neste sentido, o estado nutricional é considerado como 5º parâmetro vital, e deve ser determinado durante avaliação do paciente. Este parâmetro auxilia durante o tratamento de um estado patológico e melhora a qualidade de vida de um paciente com doença crônica (WSAVA, 2011). Além disso, o retorno da ingestão alimentar voluntária em pacientes internados deve ser considerado como uma resposta positiva ao tratamento e evolução do quadro (CORBEE, VAN KERKHOVEN, 2014; PARK, HOELZLER, 2021).

A maioria dos entrevistados determinavam a NEM apenas para os pacientes críticos e estipulavam somente o horário da alimentação. O cálculo, bem como, as especificações de horário e frequência de fornecimento alimentar se fazem necessários devido à maior demanda proteica no animal enfermo. Este paciente se encontra constantemente em processo de perda de massa magra, piorando seu prognóstico. Por este fator, garantir que a prescrição esteja de acordo com as necessidades e que o paciente esteja de fato se alimentando é uma parte importante do tratamento, que nunca deve ser negligenciada (FABRETTI et al., 2013).

Existem diversas maneiras de aumentar ou estimular a ingestão de alimentos dos pacientes internados. Assim, o aquecimento do alimento foi a opção mais escolhida entre os entrevistados, pois este método o torna mais palatável, podendo ser um estímulo suficiente. Além disso, alimentos frescos/aquecidos seriam o mais próximo possível do comportamento alimentar primitivo destes animais carnívoros (CORBEE, VAN KERKHOVEN, 2014). Uma outra opção para motivar o início da alimentação seria o estimulante de apetite medicamentoso. Entretanto, deve ser suspenso no momento em que o animal iniciar a se alimentar por conta própria, não podendo ser usado de forma contínua (OLIVEIRA, 2008). Neste sentido, esses fármacos não são frequentemente usados no pós-operatório. Um estudo retrospectivo sobre o efeito do citrato de maropitant administrado no pré-operatório em gatos submetidos à procedimentos gastrointestinais e urogenitais foi observado que não houve diferença estatística ao retorno da ingestão de alimentos durante o pós-operatório nestes pacientes (PARK, HOELZLER, 2021). Como foi possível observar nesta pesquisa, os fármacos eram utilizados como última opção, quando outras alternativas falhavam.

A administração do alimento forçado através de seringa em cães, enquanto que, nos pacientes felinos, as sondas nasogástrica e esofágica representaram a maior parte das escolhas. Segundo Nathanson (2019) sondas nasogástricas e esofágicas são possíveis escolhas nos casos de anorexia, para evitar distúrbios metabólicos e manter o aporte nutricional necessário ao animal no período de enfermidade. Além disso, a alimentação forçada pode promover repulsa ao alimento após a alta hospitalar.

A adição de água no alimento e o alimento úmido (sachê) foram escolhidos pela maioria dos veterinários como sendo as melhores opções para o aumento do consumo hídrico e alimentar. A hidratação do alimento seco antes de servir é uma das maneiras de incentivar a ingestão de líquidos, a qual promove também a liberação de aromas agradáveis. Além de suprir uma parte da necessidade de consumo hídrico e hidratar o paciente, o alimento úmido possui um teor de proteínas maior do que a ração seca (CORBEE; VAN KERKHOVEN, 2014).

O controle do peso corporal do paciente durante o período de internação era realizado pela metade dos profissionais. Esse controle é importante para se verificar se os métodos utilizados para alimentar o paciente obtiveram sucesso, e para avaliar quais recomendações devem ser feitas ao tutor no momento da alta médica, caso o animal ainda esteja com um escore corporal inadequado. Segundo Dunkel e Wilkins (2004), as avaliações do estado nutricional do internado devem ser realizadas frequentemente, e o monitoramento do peso e escore corporal informa a necessidade de suporte nutricional e a eficácia do plano instituído.

Quando questionados sobre as enfermidades mais frequentemente relacionadas à internação desses pacientes, as duas maiores causas citadas foram as desordens gastrointestinais e renais/urinárias. Doenças como enteropatias inflamatórias e doença renal promovem alterações no microbioma do trato gastrointestinal predispondo a hiporexia ou anorexia em cães e gatos. Assim, a nutrição tem um importante papel na recuperação desses pacientes (WERNIMONT et al., 2020).

Conclusões

Conclui-se que a realização da pesquisa relatada foi de suma importância para o conhecimento das práticas dos médicos veterinários da região da serra gaúcha em relação à nutrição do seu paciente internado, pois notou-se que existe a necessidade de aprimoramento nesta área durante o período de internação.

Referências bibliográficas

CODNER, P. A. Enteral nutrition in the critically ill patient. Surgical Clinics of North America, 92, 1485-1501, 2012.

CORBEE, R.J.; VAN KERKHOVEN, W.J.S. Nutritional Support of Dogs and Cats after Surgery or Illness. Open Journal of Veterinary Medicine, 4, 44-57, 2014. Disponível em: https://www.scirp.org/html/3-2280143_45130.htm . Acesso em: 22 fev. 2022.

DUDRICK, S. J. History of parenteral nutrition. Journal of the American College of Nutrition, 28, 243-251, 2009.

DUNKEL, B.M.; WILKINS, P.A. Nutrition and the critically ill horse. Veterinary Clinics of North America: Equine Practice, v. 20, n. 1, p. 107–126, 2004.

FABRETTI, A. K. et al. Avaliação clínica, laboratorial e perfil eletroforético na determinação do prognóstico de cães hospitalizados. Semina: Ciências Agrárias, v. 35, n. 6, p. 3113-3126, 2014. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/4457/445744145020.pdf . Acesso em 20 fev. 2022.

NATHANSON, O. et al. Esophagostomy tube complications in dogs and cats: retrospective review of 225 cases. Journal of Veterinary Internal Medicine, v. 33, n. 5, p. 2014-2019, 2019. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/jvim.15563 . Acesso em: 26 fev. 2022.

OLIVEIRA, J; PALHARES, M. S; VEADO, J. C. C. Nutrição Clínica em Animais Hospitalizados: da Estimulação do Apetite à Nutrição Parenteral. Revista da FZVA. Uruguaiana, v.15, n.1, p. 172-185, 2008.

PARK, L.; HOELZLER, M. Retrospective evaluation of maropitant and perioperative factors affecting postoperative appetite in cats. Can Vet J. 62:969– 974, 2021. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC8360320/ . Acesso em 03 mar.

2022.

WSAVA. Global nutrition guidelines. Journal of Small Animal Practice • Vol 00, p:1-12, 2011. Disponível em: https://wsava.org/global-guidelines/global-nutrition- guidelines/ . Acesso em: 03 mar. 2022.

WERNIMONT S.M., et al. The Effects of Nutrition on the Gastrointestinal Microbiome of Cats and Dogs: Impact on Health and Disease. Frontiers in Microbiology. 11, p. 1-24, 2020. Disponível em: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fmicb.2020.01266/full . Acesso em: 28 fev. 2022.

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