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Nutrição do paciente oncológico: um desafio metabólico

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Autor(a): Bárbara Barreiros Fernandes

Orientador(a): Sarah Paschoal Scarelli

Instituição: Universidade Estadual de Londrina

Trabalho Classificado na 9ª Edição (2023) do Prêmio de Pesquisa PremieRpet®.

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Índice

Resumo

Frequentemente, cães e gatos acometidos por diversas neoplasias apresentam alterações no apetite, na metabolização de nutrientes e requerimento energético, o que torna o estado nutricional um componente muito importante a ser avaliado nestes pacientes, visto o impacto na resposta ao tratamento e qualidade de vida. O presente trabalho teve como objetivo realizar uma revisão bibliográfica sobre as principais alterações nutricionais apresentadas pelos pacientes oncológicos e sobre as opções de nutrição para os mesmos. As citocinas inflamatórias são responsáveis pela caquexia paraneoplásica apresentada por estes pacientes, juntamente com alterações de apetite e metabolismo. A alimentação do paciente oncológico deve ser palatável, energética, fracionada e preferencialmente rica em gorduras e proteínas, do que em carboidratos, que são o principal meio de obtenção de energia das células tumorais. Além disso, outras estratégias devem estar associadas, como o uso de nutracêuticos, estimulantes de apetite e até tubos de alimentação. O cuidado com o manejo alimentar do paciente oncológico visa suprir as suas necessidades energéticas, melhorar a resposta ao tratamento oncológico, e assim, manter a qualidade de vida e o bem-estar, além de prolongar o tempo de vida dos cães e gatos portadores das mais diversas neoplasias.

Introdução

Com a melhora nos cuidados com a saúde dos animais de companhia, houve um aumento da expectativa de vida dos cães e gatos, e concomitantemente, também houve aumento do número de casos de câncer nesses animais, afecção que ocorre com maior frequência a partir da meia-idade a idosos (BARREIRA, 2020).

O paciente oncológico deve ser atendido sob diversas ópticas, tanto o tratamento clínico-cirúrgico e protocolo quimioterápico quanto nos aspectos psicossociais e sintomáticos, como bem estar, alimentação, cuidados, controle da dor e qualidade de vida.

É frequente que pacientes com câncer apresentem alteração tanto no apetite quanto na metabolização de nutrientes e requerimentos energéticos. Assim, um dos componentes a ser avaliado nos pacientes oncológicos é o estado nutricional, pois tal aspecto pode afetar o sucesso do tratamento, bem como a desnutrição tem impacto negativo no prognóstico e na qualidade de vida desses pacientes (RAUH et al., 2018). Dessa maneira, garantir o manejo nutricional adequado para esses pacientes é de suma importância para minimizar os efeitos dessas alterações para o organismo (CASE et al., 2011).

Portanto, o objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão bibliográfica sobre as principais alterações nutricionais que os pacientes oncológicos podem apresentar, bem como trazer opções de nutrição para os mesmos.

Desenvolvimento

A caquexia em pacientes com câncer é uma síndrome paraneoplásica caracterizada pela redução da alimentação e por perda de peso progressiva, devido a alterações no metabolismo de carboidratos, proteínas e gorduras, cujas consequências são evidenciadas em anorexia, apatia, perda de peso, queda da imunidade e má nutrição e estas afetam a qualidade de vida e a resposta ao tratamento e sobrevida (CASE et al., 2011; BONOTTO, 2017). Em doenças crônicas, a perda de peso é um componente crucial e portanto deve ser avaliada cuidadosamente. A desnutrição associada à caquexia e anorexia em pacientes oncológicos pode ocorrer devido ao aumento da circulação de citocinas inflamatórias envolvidas com o processo tumoral, como fator de necrose tumoral (TNF-α), interleucina 1 e 6 (IL-1, IL-6), as quais mediam alterações metabólicas causadas pela doença ou por efeitos colaterais do tratamento, principalmente o quimioterápico. Como consequência, tem-se diminuição do apetite, hiporexia a anorexia e consequente perda de peso (BAEZ et al., 2007; BARREIRA, 2020).

Além disso, o processo neoplásico pode ocasionar a diminuição da ingestão de alimentos diretamente, ou seja, pela presença de massas no trato gastrointestinal, ou por efeitos indiretos no apetite e metabolismo, como diminuição do paladar e alterações centrais no controle da ingestão e saciedade e principalmente as alterações bioquímicas no metabolismo de carboidratos, proteínas e lipídeos (BAEZ et al., 2007; SANTOS, 2022).

A alimentação do paciente oncológico deve levar em consideração as alterações metabólicas das células saudáveis e das tumorais. A principal forma de obtenção de energia das células tumorais é a glicose anaeróbia e consequente produção de lactato, entretanto, apresentam uma deficiência na obtenção de energia por glicólise aeróbica e oxidação de lipídeos. Dessa maneira, as neoplasias consomem grandes quantidades de glicose dos pacientes, o que gera perda de massa e acúmulo de lactato, o qual será usado na gliconeogênese. Todos esses fatores levam à alteração da secreção de insulina e glucagon, intolerância à glicose e resistência à insulina, estresse oxidativo, inflamação sistêmica e caquexia. As principais consequências deste processo são hiperglicemia, hiperlactatemia, resistência à insulina e alterações de alimentação (CASE et al., 2011; BONOTTO, 2017; SANTOS, 2022).

Doenças crônicas como o câncer alteram o metabolismo e muitas vezes os aminoácidos são utilizados excessivamente como fonte de energia na gliconeogênese hepática, o que resulta em balanço energético negativo de nitrogênio, depleção dos estoques proteicos e potencializa o catabolismo muscular. A perda proteica, principalmente a hipoalbuminemia, por sua vez, gera diminuição da imunidade, da função gastrointestinal, conhecida como enteropatia por perda de proteínas, e retardo na cicatrização de feridas (CASE et al., 2011; BONOTO, 2017; SANTOS 2022).

Já o metabolismo lipídico encontra-se alterado devido ao aumento da lipólise e diminuição da lipogênese, com aumento do turnover de ácidos graxos livres e glicerol (SANTOS, 2022). Isso se deve ao fato que as células tumorais não são capazes de utilizar lipídios como fonte de energia, mas os tecidos do organismo são plenamente capazes de oxidar lipídios para obtenção de energia (CARCIOFI; BRUNETTO; PEIXOTO, 2016).

A avaliação do estado nutricional de cada paciente com câncer pelo médico veterinário é de suma importância, engloba histórico e exame físico, nos quais pode- se observar alterações de massa muscular e de estoque de gordura e perda de peso, e avaliação laboratorial, que deve conter eritrograma, leucograma e avaliação de albumina e glicose sérica. A resolução da caquexia paraneoplásica se daria idealmente pela remoção completa da neoplasia, nos casos em que esta é possível, o que infelizmente, não são todos. Portanto, a instituição de suporte dietético para tentar minimizar a caquexia dos pacientes oncológicos é extremamente importante para evitar a perda de peso, aumentar a tolerância do organismo às diversas modalidades de tratamento oncológico e melhorar a imunidade e qualidade de vida (BARREIRA, 2002, HAND et al., 2010; CARCIOFI; BRUNETTO; PEIXOTO, 2016; SANTOS, 2022).

O desafio na alimentação de pacientes oncológicos é, além de oferecer nutrição completa e balanceada, fornecer calorias e nutrientes em quantidade adequada diante da diminuição da ingestão de alimentos e frente às alterações metabólicas associadas a caquexia paraneoplásica (SANTOS, 2022). Dado a preferência das células tumorais por metabolizar carboidratos, uma das estratégias de aporte nutricional para o paciente oncológico é a instituição de dietas mais gordurosas e proteicas do que ricas em carboidratos, e altos níveis de ácidos graxos ômega-3 (CASE et al., 2011; BONOTO, 2017; SANTOS, 2022). Outro aspecto a ser explorado na nutrição dos pacientes com câncer é a palatabilidade, como tentativa de estímulo ao apetite (BILLER et al., 2016).

Estudos demonstram que alguns ácidos graxos, como o Ômega 3, possuem ação na diminuição da taxa de crescimento tumoral, melhora nos parâmetros metabólicos, diminuição da síntese de mediadores inflamatórios, auxiliam na eficácia da quimioterapia e melhoram a tolerância ao tratamento e consequentemente, restabelecem a qualidade de vida e prolongam o tempo de sobrevida (CORSETTO et al., 2011; MAULDIN, 2012).

Dietas ricas em gordura são benéficas para alterar o metabolismo de carboidratos para gorduras, retardar o crescimento tumoral e diminuir a intolerância à glicose e perdas de tecido adiposo. São também vantajosas por terem maior densidade energética e palatabilidade, o que é interessante para pacientes com hiporexia e anorexia, como é o caso dos pacientes oncológicos (CARCIOFI; BRUNETTO; PEIXOTO, 2016).

Deve-se fornecer níveis proteicos maiores do que o usual, e com proteínas de alta qualidade, visto a necessidade aumentada devido ao processo neoplásico e desnutrição (HAND et al., 2010; CASE et al., 2011; SANTOS 2022). A suplementação com aminoácidos individuais, como glutamina e arginina, é benéfica para doenças neoplásicas em humanos, no entanto é pouco estudada na medicina veterinária (MAULDIN, 2012).

Os níveis de carboidratos na alimentação de cães e gatos com neoplasias não deve exceder 25% do total, sendo recomendados níveis de calorias e gorduras de 25 a 40% da matéria seca, 5% de ômega-3 e 30-45% de proteína para cães e 40 a 50% para gatos, e fibras cerca de 2,5% da matéria seca (CARCIOFI; BRUNETTO; PEIXOTO, 2016; HAND et al., 2010).

Além das quantidades de cada nutriente, deve-se também calcular a necessidade energética de manutenção (NEM) para animais saudáveis e acrescentar 20 a 50% de energia total para os pacientes oncológicos, devido ao aumento do requerimento energético destes (CARCIOFI; BRUNETTO; PEIXOTO, 2016; HAND et al., 2010). É de suma importância monitorar o consumo pelo paciente, pois muitos cães e gatos com caquexia paraneoplásica apresentam inapetência (CARCIOFI; BRUNETTO; PEIXOTO, 2016; JOHANNES; MUSSER, 2019).

As tentativas de estimular a alimentação incluem: aquecer a comida, oferecer refeições menores com maior frequência, alimentação saborosa e aromática, em ambiente calmo, além de tratar náuseas, vômito e constipação (ESPER; HALB, 2005; FREEMAN, 2012). Estimulantes de apetite também são indicados, tais como ciproeptadina ou mirtazapina (CASE et al., 2011; JOHANNES; MUSSER, 2019).

Quando estas tentativas não são eficazes, e os animais não ingerem nada por três a sete dias, ou apresentem perda de mais de 10% do peso em uma ou duas semanas, é indicado a alimentação forçada com seringa ou a colocação de tubos de alimentação para terapia dietética enteral, seja por sonda nasogástrica, sonda esofágica ou sonda gástrica, a fim de amenizar a caquexia do câncer, pois torna possível a alimentação assistida, com a utilização de alimentos hipercalóricos diluídos em água (CARCIOFI; BRUNETTO; PEIXOTO, 2016; VAIL;THAMM; LIPTAK, 2019) .

A alimentação enteral é a primeira opção para manutenção da alimentação se o trato gastrointestinal do animal estiver funcional, mas caso não seja possível, a nutrição parenteral, realizada por via endovenosa, é indicada para pacientes oncológicos com alta probabilidade de remissão, durante o pós-operatório de cirurgias gastrointestinais ou anorexia induzida por quimioterapia (CARCIOFI; BRUNETTO; PEIXOTO, 2016; VAIL; THAMM; LIPTAK, 2019; SANTOS 22).

Pode-se também incluir nutracêuticos, como vitaminas antioxidantes (C e E), flavonoides, vitamina D, ácidos graxos, os quais diminuem os efeitos paraneoplásicos e desequilíbrios metabólicos decorrentes da neoplasia e do tratamento desta (DAVI et al., 2010; SILVA et al., 2020).

Considerações finais

Pacientes oncológicos enfrentam alterações no apetite, na metabolização de nutrientes e no requerimento de energia, e as consequências da caquexia nestes pacientes influenciam na resposta ao tratamento, aumentam a qualidade de vida e prolongam o tempo de sobrevida. Portanto, a alimentação de cães e gatos portadores de neoplasias deve considerar as alterações de apetite e o tipo de metabolismo das células tumorais, que é preferencialmente a quebra de carboidratos com esgotamento da reserva de glicose dos animais. Assim, as principais estratégias de suporte nutricional para estes pacientes são: implementar dietas com mais gorduras e proteínas de alta qualidade, com ácidos graxos ômega 3, palatáveis e de maior densidade energética, nutracêuticos como vitaminas C, D, E, flavonoides e ácidos graxos, bem como estimulantes de apetite, aquecer a comida, oferecer porções menores mais vezes ao dia, tratar sintomas como vômito e constipação ou, ainda, colocar tubos de alimentação para nutrição enteral. O manejo alimentar de pacientes com câncer é extremamente desafiador, dado as alterações metabólicas e energéticas, no entanto tem suma importância na manutenção da qualidade de vida e na melhora da resposta ao tratamento oncológico e consequentemente na sobrevida destes cães e gatos.

Referências bibliográficas

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