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Considerações sobre o efeito da humanização animal na nutrição de cães e gatos

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Autor(a): Nathaniele Bianchi

Orientador(a): Marlise Pompeo Claus

Instituição: Improve International

Trabalho classificado na 7ª Edição (2021) do Prêmio de Pesquisa PremieRpet®.

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Índice

Resumo

A humanização dos animais de companhia está cada vez mais evidente, refletida pela forma como os animais são tratados, sendo considerados como membros da família. Essa relação para o ser humano é muito prazerosa, porém poderão trazer diversos malefícios para os animais, como a ansiedade, compulsão alimentar, comportamentos obsessivos, transtorno de separação, gastrite, entre outras. Essa revisão de literatura tem como objetivo mostrar o impacto que a humanização dos animais domésticos pode causar para o comportamento e saúde dos animais, principalmente no que diz respeito a nutrição adequada dos animais. Para que o animal possa viver bem, é necessário garantir as cinco liberdades do bem-estar animal, que se referem ao estresse, dor, doença, fome e sede, além de serem livres para apresentar o seu comportamento natural. Um grave problema causado pela humanização dos animais é a obesidade, que atualmente é a patologia nutricional mais comum em cães e gatos. Outra preocupação está relacionada com a forma que a alimentação animal acompanha as tendências da alimentação humana, como as dietas caseiras e as dietas vegetarianas ou veganas, que são assuntos do momento. Porém, se esta dieta não for realizada de maneira correta e orientada por um profissional especializado em nutrição, poderá causar deficiência nutricional no animal, levando a doenças mais graves.

Palavras-Chave: Humanização, Nutrição, Obesidade, Veganismo, Dieta

Introdução

A ligação e interação do homem com os animais é muito antiga, com registros que datam cerca de 12 mil anos. Originalmente essa relação era de trabalho e/ou fonte de alimento para o homem, porém esses animais, principalmente os cães e gatos, foram sendo trazidos para dentro dos lares e das famílias, sendo hoje considerado um membro familiar por muitos tutores, e cada vez mais são tratados como humanos (BUENO, 2020).

A humanização dos animais de companhia está cada vez mais relevante, devido a um aumento significativo na população total de pets (BUENO, 2020; CRMV-RJ, 2020). Segundo o IBGE, o Brasil já tem mais cães e gatos do que crianças (AGÊNCIA SENADO, 2020) e, de acordo com o relatório do estudo da organização britânica Pet Food Manufacturer Association (PFMA), cerca de 40% dos lares no mundo possuem pelo menos um animal de estimação (BUENO, 2020).

Com o processo de humanização, os cães estão deixando de ser o segurança da propriedade, que dormem fora de casa, para se tornarem os “bebês” de seus tutores, sendo mimados e muitas vezes dormindo até na mesma cama e comendo da mesma comida (CRMV-RJ, 2020; WALL, 2020). Por um lado, essa preocupação e cuidado é positiva, pois garante bem-estar e qualidade de vida para os animais. Porém, muitas vezes esse comportamento dos humanos com relação aos animais pode ser prejudicial, trazendo ao animal, como obesidade, desvio de comportamento, entre outros (CRMV-RJ, 2020).

Esta revisão de literatura tem por objetivo relatar o impacto que a humanização dos animais pode causar na saúde, principalmente no que diz respeito a nutrição adequada dos animais.

Desenvolvimento

O termo animal doméstico refere-se aos animais que vivem dentro ou no entorno de casa, tendo suas necessidades supridas pelos seres humanos. Até a década de 1960, os animais domésticos viviam com as famílias e desempenhavam a função de trabalho, como guarda, tração, caça, entre outros (ABINPET, 2020; OVERGAAUW et al., 2020). Após a 2° Guerra Mundial, houve muitas mudanças na sociedade, como maior tempo de lazer e individualização das pessoas, onde os animais de companhia foram ganhando cada vez mais o seu espaço e hoje já são considerados, para muitos, como membro da família (OVERGAAUW et al., 2020).

Por conta dessa aproximação cada vez maior dos animais com o homem, a população dos animais de estimação está aumentando. De acordo com o IBGE, no censo realizado em 2019, o Brasil já possui mais de 141 milhões animais de companhia, sendo cerca de 55 milhões de cães, 40 milhões de aves, 24 milhões de gatos, 19 milhões de peixes e 2 milhões de outras espécies (Figura 1) (ABINPET, 2020).

População de animais de companhia no Brasil em 2019. Fonte: ABINPET (2020)
Figura 1 - População de animais de companhia no Brasil em 2019. Fonte: ABINPET (2020)

Essa integração com os animais, traz muitos benefícios físicos e mentais para os seres humanos, incluindo a potencialização da empatia e a autoconfiança em crianças, aumento de felicidade, suporte social e a redução da angústia, ansiedade, solidão e depressão. Cerca de 95% dos tutores de cães e 93% dos tutores de gatos, relataram que são mais felizes por terem seu animal de estimação (OVERGAAUW et al., 2020), contudo os benefícios dessa relação não são exclusivos para os seres humanos. Os animais também podem se beneficiar, quando a relação é saudável e não excessiva (CRMV-RJ, 2020; OVERGAAUW et al., 2020).

Nas últimas décadas, os animais foram reconhecidos como seres sencientes, capazes de sentirem e experimentar emoções positivas e negativas. Portanto, para o seu bem-estar, devem ser mantidos livres de estresse, dor, doença, fome e sede e devem ser livres para apresentar o seu comportamento natural conhecido como “As Cinco Liberdades do Bem-estar Animal” (OVERGAAUW et al., 2020).

O fato de as pessoas decidirem por viver sozinhas ou adiarem os planos de terem filhos, acabam por incentivar a compra ou adoção de um animal de companhia, e passam a dedicar todo o seu amor ao animal, tratando-o como um “bebê”. Por esse laço tão forte com os animais, muitos acabam atrapalhando o desenvolvimento e a saúde dos animais, pois quando são tratados como humanos possivelmente terão doenças de seres humanos, como ansiedade, compulsão alimentar, comportamentos obsessivos, transtorno de ansiedade por separação, gastrite, entre outras (CRMV-RJ, 2020).

Relacionado com a alimentação dos animais, muitos acabam por não receber apenas rações ou petiscos desenvolvidos para a nutrição animal, pois eles querem e ganham a comida humana, gerando um comportamento inadequado para o animal, onde o principal problema está relacionado ao excesso de peso, que leva a obesidade (CRMV-RJ, 2020). A obesidade é o acúmulo excessivo de tecido adiposo no corpo como resultado da ingestão alimentar excessiva ou da pouca utilização de energia pelo corpo (GERMAN, 2006; BOMBERG et al., 2017). Atualmente, a obesidade é a patologia nutricional mais comum em cães e gatos, e na maior parte das vezes, está relacionada com a humanização, como consequência de não restringir a alimentação em quantidade, qualidade e frequência ofertada ao animal (GERMAN, 2006; CRMV-RJ, 2020).

Em uma pesquisa realizada pelo Conselho Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos, foi observado que cerca de 25% dos cães e gatos, na região Oriental estavam acima do peso ideal, enquanto 40% dos cães norte americanos e 20% dos cães brasileiros estavam obesos (CRMV-SP, 2012; PROVIDELO, TARTAGLIA, 2013; BOMBERG et al., 2017). Segundo Bomberg et al. (2017), estima-se que 30% da população humana mundial esteja acima do peso ou obesas, enquanto a população de cães e gatos acima do peso ou com obesidade representam 59%.

Há uma grande relação entre a obesidade em pessoas e animais de companhia, possivelmente relacionadas aos elementos ambientais e ao estilo de vida compartilhado com o animal, fazendo menos exercícios físicos e recebendo mais alimentos inadequados, como petiscos e guloseimas impróprios, principalmente nos momentos em que os tutores estão preparando ou realizando as refeições, pois sentem que o pet é seu companheiro naquele momento e merece esse “agrado” (CRMV-SP, 2012; BOMBERG et al., 2017). Os animais que apresentam esse distúrbio nutricional, possuem maior risco de morbidade e redução da sua longevidade, além de outros problemas de natureza diversa, tais como doenças ortopédicas, respiratórias, cardíacas, endócrinas, oncológicas, dermatológicas, além de possíveis complicações anestésicas, assim como em humanos (GERMAN, 2006; BOMBERG et al., 2017).

Outro impacto que a humanização pode acarretar para a saúde nutricional do animal está relacionada ao veganismo de cães e gatos. Esse é um tópico contemporâneo muito comentado e, se realizado de maneira não orientada por um profissional, também pode acarretar malefícios aos animais, principalmente para os gatos, que são carnívoros obrigatórios (BROWN et al., 2009; GUIMARÃES, 2020).

Os animais que recebem dieta vegana são consequência de uma escolha e mudança de alimentação de seus tutores, que optam por não ingerir produtos de origem animal. Por mais que realizem com boa intenção, acabam por não oferecer todos os nutrientes necessário e balanceados, que são supridos pelas rações (BROWN et al., 2009; TURRER, JUNIOR, MOURA, 2011; SANTOS, 2019;

GUIMARÃES, 2020). Turrer, Junior e Moura (2011), relatam que os tutores veganos acreditam ser incoerente o fato de não se alimentarem com carne, mas fornecer uma ração com proteína animal para seus animais de estimação. Um estudo realizado na Nova Zelândia e no Canadá com 3673 tutores, mostrou que 10% dos cães e 3% dos gatos seguiam uma dieta vegetariana ou vegana. Dos entrevistados, 6% eram veganos e desses, 27% ofereciam apenas vegetais a seus animais (SANTOS, 2019).

Porém, para mudar drasticamente a dieta dos animais, alguns pontos precisam ser levados em consideração, não somente retirar a proteína animal e fornecer vegetais. Primeiramente um médico veterinário ou zootecnista especializado em nutrição precisa ser consultado para avaliar as necessidades nutricionais de cada animal e assim orientar a forma de suprir essa necessidade específica da melhor forma (BROWN et al., 2009; SANTOS, 2019). Os cães, por serem classificados como onívoros, estão aptos a comer tanto carnes como vegetais em seus ambientes naturais. Por conta disso, pode ser mais fácil se adaptar com uma dieta sem proteína animal. Entretanto, a dieta deve ser completa e balanceada, adicionando suplementos nutricionais necessários (BROWN et al., 2009).

Segundo Brown et al. (2009), quando a dieta vegana ou vegetariana é introduzida aos cães de forma correta e supervisionada por um profissional, há grandes vantagens. Segundo seu estudo, quanto mais tempo um cão permanece ingerindo essa dieta, maior a probabilidade de ter uma saúde geral boa ou excelente, reduzindo a chance de desenvolver câncer, infecções, hipotiroidismo e obesidade. Porém, se realizada de forma descontrolada, pode aumentar os cálculos urinários, por conta do pH da urina. Também, se a dieta não tiver a suplementação de L- carnitina ou taurina, pode aumentar a probabilidade de cardiomiopatias dilatadas ou outras cardiopatias. Um outro exemplo é a soja, que quando utilizada nas rações veganas ou vegetariana pode causar reações em animais alérgicos (BROWN et al., 2009). Em contrapartida aos cães, os gatos são classificados como carnívoros obrigatórios, porém podem se adaptar a dietas veganas, quando essas são suplementadas e monitoradas por um profissional especializado. Contudo tal mudança ainda é um grande desafio, visto que muitos nutrientes essenciais são encontrados exclusivamente em ingredientes de origem animal. Assim como nos cães, se a dieta oferecida não for balanceada, é muito provável que surjam distúrbios no animal (BROWN et al., 2009).

Considerações finais

A humanização pode afetar muito a vida do animal, causando doenças e problemas comportamentais, por ficarem extremamente dependentes do ser humano para realizar todas as suas necessidades. Os animais precisam viver o mais próximo possível do que viveriam na natureza, por isso os tutores devem garantir tempo ao ar livre, espaço para brincar, interação com outros animais e, principalmente, alimentação saudável.

Em termos de nutrição, é fundamental o fornecimento de uma dieta adequada para cada tipo de animal, evitando assim o aparecimento de doenças como a obesidade, doenças ortopédicas, respiratórias, cardíacas, endócrinas, oncológica, dermatológicas, entre outras. Cada vez mais verificamos que as tendências da alimentação animal acompanham as da alimentação humana, porém é preciso ter cuidado para não ser influenciado por tendências do momento, como dietas caseiras e dietas veganas, pois essas, sem o auxílio e acompanhamento de um médico veterinário, podem trazer grandes riscos ao animal.

Uma dieta deve sempre ser formulada por profissionais capacitados, pois, além do peso metabólico, muitos outros parâmetros são levados em consideração no momento de formular uma dieta adequada ao animal, para que ele não tenha deficiência de nutrientes essenciais. Já há no mercado rações vegetarianas e veganas prontas, podendo ser a melhor opção para os tutores que são adeptos dessa dieta.

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WALL, T. Humanization, natural pet foodtrends may be near limit. Petfood Industry – June 2020 – Humanization, natural pet food trends may be near.

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